segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Globalização


O texto a seguir foi escrito há mais de 30 anos e já apontava para o comportamento da sociedade em um mundo globalizado.

O que fazemos quando viajamos? Procuramos logo um Shopping com suas lojas, restaurantes e lanchonetes conhecidas?

A desterritorialização da cultura

Enzensberger (ENZENSBERGER, H. M. Com raiva e paciência. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 1985) conta a história de um executivo alemão que foi mandado à China para projetar uma grande instalação industrial. Durante algumas semanas, devido às exigências de sua profissão, ele se vê obrigado a viver uma experiência amarga. Não fala chinês, desconhece os costumes locais, ressente-se da falta dos automóveis, encontra-se na contingência de partilhar um modesto quarto de hotel com outro viajante qualquer. De retorno a Hong Kong, sua conexão para voltar à Europa, respira aliviado. A paisagem que o cerca é sua velha conhecida. Mas por que um alemão sente-se em casa em Hong Kong? O que lhe é tão familiar neste lugar longínquo?

A história de Enzensberger, talvez uma fábula, recoloca o tema da desterritorialização. [...]
[...] Nos pontos mais distantes, Nova York, Paris, Zona Franca de Manaus, na Ásia ou na América Latina nos deparamos com nomes conhecidos – Sony, Ford, Mitsubitschi, Phillips, Renault, Volkswagen. 

Qual o significado disso? Que a mundialização não se sustenta apenas no avanço tecnológico. Há um universo habitado por objetos compartilhados em grande escala. São eles que constituem nossa paisagem, mobiliando nosso meio ambiente. 

As corporações transnacionais, com seus produtos mundializados e suas marcas facilmente identificáveis, balizam o espaço mundial. Biscoitos Nabisco, iogurte Danone, chocolate Nestlé, cerveja Budweiser, tênis Reebok  mapeiam nossa familiaridade. Sem essa modernidade-objeto, que impregna os aeroportos internacionais (são idênticos em todos os lugares), as ruas do comércio (com suas vitrinas e mercadorias em exposicão), os móveis de escritórios, os utensílios domésticos, dificilmente uma cultura teria a oportunidade de se mundializar. É a esta presença cheia, de um espaço desterritorializado, que Enzensberger serefere. 

A China Popular, para nosso executivo alemão,é um "mundo" distante, inóspito. Em seu território, tudo lhe é estranho. Em contrapartida, Hong Kong r representa algo próximo, um recanto povoado por coisas de sua vida prosaica (hotéis, padrão de refeição e de conforto, táxis etc.). 
Envolvido por uma miríade de objetos-mobílias, ele sente-se à vontade neste mundo-mundo. Familiaridade que se realiza no anonimato de uma civilização que minou as raízes gráficas dos homens e das coisas. (ORTIZ, Renato. Mundialização e Cultura. São Paulo, Brasiliense, 1994. p.105, 107-108)

E você se identificou com o alemão?



Fonte: Livro de Maria Lúcia A. Aranha e Maria Helena P. Martins "Filosafando, introdução à filosofia"

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